segunda-feira, 16 de junho de 2014

A resposta do vizinho

A vizinha, por Maice Glaser (minha amiga)


No prédio ao lado do que moro vive uma mulher. Vivem muitas mulheres, mas esta é a que me chama atenção. Ela é jovem, deve ter trinta e poucos anos, tem os cabelos mechados, na altura dos ombros, é alta, é triste. Enquanto coloco meu avental vermelho (presente do Dado para comemorar o trigésimo sétimo jantar da turma) e começo a preparar os comes e bebes (mais bebes do que comes), eu a observo. Ela tem um jeito indefinido e confesso que meu olhar já não alcança tão longe, mas ela ne dá uma impressão de desassossego. Parece uma personagem de algum livro Russo, talvez de uma história de amor inacabada, talvez uma personagem à espera de uma história. O que sei é que ela me intriga e me acalenta ao mesmo tempo. Gosto de vê-la ali, tão próxima e ao mesmo tempo tão distante.

Enquanto preparo os aperitivos (o Léo diz que sempre tem que ter aperitivos antes do jantar, para esquentar o papo), levanto o olhar de vez em quando para a janela da cozinha dela. Muitas vezes tenho vontade de dizer a ela (ainda tão jovem), que seja o que for que a angustia tanto, vai passar. Que os dias correm sem piedade de nossos medos ou dúvidas. Correm. Que o que importa é ter amigos (talvez um grupo de mulheres como estes homens que frequentam minha casa há tantos anos). Amigos para o futebol, amigos para falar sobre o livro que acabamos de ler, amigos para ir ao cinema, amigos que tenham o número do telefone de nossos pais (os meus não mais) e nossos filhos (o Joca tem o número do telefone de meus três filhos), amigos para o passeio da manhã, outros para o bar da noite, outros para o silêncio. Dizer que esta solidão que ela sente, não passa. Afinal, somos sós, mas isto não é necessariamente ruim. Gosto de minha companhia. Mas não foi fácil chegar até aqui. Como diz o Paulão: “É um longo caminho até nos sentirmos em casa, quando a casa é o que resta de nós.”

Moça bonita, podia ser minha filha. E faz tempo que a danada não me telefona. Vou ligar hoje e perguntar: “Babi, cadê você?” E ela vai rir e dizer: “Pai, falei com você ontem.” E eu vou fingir que esqueci e vamos rir juntos.

Ela podia ser minha filha. Se fosse, eu a colocaria no colo e diria mais uma vez: “Isso vai passar.”

O Maneco está chegando. É sempre o primeiro. Vou colocar o samba para tocar e ele vai dizer: “Samba é bão” e vai dar aquelas voltas pela sala enquanto serve-se de cerveja.


Eu volto à cozinha e tenho vontade de acenar para a moça e dizer: “Vem, vem dançar e comer e beber com a gente”, mas ela parece tão longe, nunca olha em minha direção. Talvez seja o choro embaçando o olhar. Moça bonita, assim não vai ver o Bão da vida.

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