Não vai dar tempo. De limpar os armários, esvaziar as
gavetas, encher a despensa, trocar as lâmpadas, pendurar os quadros, pagar as
contas, responder os e-mails, retornar as ligações, pisar na areia. Parece que
o ano novo vai chegar já misturado ao velho. Parece que o velho só vai deixar
de ser velho quando o novo já estiver quase velho. Quando outro chegar também
em meio à falta de tempo. E tudo se misturar de novo. Porque as gavetas terão
sido esvaziadas, mas estarão cheias de novo. As lâmpadas terão sido trocadas,
mas terão queimado de novo. Porque as lâmpadas não param de queimar, assim como
a despensa não para de se esvaziar. É sempre tempo de ir ao supermercado. É
sempre tempo de ter uma lista de pendências que não finda. É sempre tempo
do novo. É sempre tempo do velho.
* *
*
Quando eu era (era?) criança, achava que o ano novo e o ano velho
se revezavam. Em um ano chegava o novo, no outro chegava o velho. A música se
alternava para saudá-los: adeus ano
velho, feliz ano novo e adeus ano
novo, feliz ano velho. E um dia, na dúvida sobre quem chegaria, perguntei
para a minha mãe: esse ano chega o novo ou o velho? Quando ela me explicou que é sempre o novo que chega e
as passagens perderam um pouco a graça para mim.
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