quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Uma gota de pânico no meio do oceano (qual?)


Já parou para pensar que você pode viver muito tempo, cem anos, até cento e dez, por exemplo, ou seja, uma vida longa, uma vida humana inteira, sem conhecer um muçulmano que vive numa cidadezinha do Afeganistão, ou de Bangladesh, que apenas vive todos os dias como você, rezando e trabalhando pelo bem das pessoas que ama? Ou um chinês que mora em Jinan e come besouro e cachorro assim como você come ostra e porco? E um judeu em Hadera que só faz trabalhar para quitar os boletos, como você? Já parou para pensar que nessa sua vida inteira, sua vida longa, você pode nem mesmo saber onde fica Comores, muito menos imaginar que milhares de pessoas vivem lá querendo exatamente o que você, que vive aqui, quer? E poderá nunca saber como é viver da terra, com as mãos marrons e calosas e o olhos para cima, na Itália, no Brasil ou na Rússia? E viver da pesca, num rio ou num mar cuja existência você ignora? E ficar sozinho no mundo, único sobrevivente de uma cidade engolida por ondas gigantes ou destruída pela ganância de algum homem? E a música marroquina, os filmes húngaros, a literatura de Brunei? O sabor da comida feita no interior de Roraima ou num apartamento do Upper West Side? Ou seja, já parou para pensar que você pode viver muito tempo, cem anos, até cento e dez, ter viajado, lido, escutado, visto, experimentado, mas mesmo assim, mesmo tendo feito isso em cada um dos seus mais de trinta e seis mil dias, você irá morrer sem saber absolutamente nada sobre esse mundo?

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