quinta-feira, 12 de março de 2015

Crendice

Leite com manga dá dor de barriga. Gato preto traz azar. Bolsa no chão leva o dinheiro. Ovo no telhado espanta chuva. Nunca acreditei em nada disso, mas um mês depois dele ter sonhado com seus próprios dentes caindo, ele morreu. Ele no caixão e eu pensando nos dentes caindo no sonho. Continuei a não acreditar, mas no meu sonho dessa noite, vinte e três anos depois da morte dele, eram os meus dentes que desfolhavam e deixavam minha gengiva feito árvore em inverno rigoroso. Eu tentava colocá-los de volta, mas o vento batia ainda mais e levava os meus dentes. Todos. À minha frente, a risada da amante do meu marido, feliz por me ver desesperadamente banguela. Tão feliz. Meu marido, o amante dela, o nosso mesmo homem impávido. Acordei e corri para o espelho, todos – dentes e medo – ainda ali, fortes. Um amor já enterrado por causa de dentes caídos; não sei, pode ser que funcione, mas se for para vir, que venha a morte da amante, para que eu possa viver até curar minha dor, ao menos. Amém. 

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