E se o mundo
acabar daqui a quatro dias, não voltarei a comer a bala de gergelim que derretia
na minha boca infantil. E terei visto tantas crianças morrerem antes do tempo,
pelas mãos da fome, do caranguejo e da maldade, em São Paulo, Salvador ou
Connecticut. Não mandarei desentupir a privada: que a merda fique para os
arqueólogos do futuro. Tentarei um café com uma amiga – a vida sem amigos é
cinza e fria, como a São Paulo que nos rouba o fruto do trabalho. Não arrumarei
o armário da cozinha: que caia com todas as louças: quero ver aos pedaços tudo
que não tem serventia. Beijarei meus filhos mais uma vez – não: mais duas,
mais três, mais quatro, mais quantas vezes conseguir. E pedirei desculpas por
ser mãe. E perdoarei a minha mãe. E todas as outras. Que Justine me dê sua mão
sã. E que todas as Claires se afastem de mim: hoje, amanhã e depois, até o fim.
Quero a sanidade de uma mente doente, as mãos de um homem só que se sabe único,
uma moqueca com farofa e a voz de Vinícius ao fundo. Não colocarei botox: quero
todas as minhas rugas sulcadas pela dor. Talvez pinte os cabelos de
amarelo-gualdo. Amarelo-ouro? Amarelo-indiano? Amarelo-urina? Talvez os pinte de preto e morra como ela: linda e forte.
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