quarta-feira, 1 de outubro de 2014

O parto

Um grito. Agudo. Ele acordou assustado. Ela já estava sentada na cama. Suada. Vai nascer!, ela disparou; a testa, os ombros, os braços e as mãos molhadas. Mais um grito. Ele tapou os ouvidos, instintivamente. Vai nascer!, mais um disparo. Mas você não está grávida, ele conseguiu retrucar, acossado no seu canto da cama. Ele não a reconhecia naquele rosto retorcido. Vai nascer!, era só o que saía daquela boca escancarada. Você não está grávida!, ele tentou mais uma vez. A camisola grudada no corpo encharcado mostrava o ventre dela: murcho. Ela parada com a boca aberta como em um retrato. Edvard Munch era só no que ele pensava. Porra, você não está grávida! Fora!, fora!, fora!, foi o que começou a sair de dentro dela. Fora! Ela o tirou da cama com um chute. Fora! Ele pegou só a chave do carro, foi descalço e com o peito nu. Ela escutou a porta bater e viu escorrer por suas pernas um líquido marrom avermelhado, espesso e fétido. Mas de expulsão necessária. 

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