Chegaram em seis, divididos em três carros. A rua estava
cheia, era quase hora do almoço, o sol amolecia as pessoas. Na calçada um
tabuleiro. No tabuleiro fatias de melancia, pêssegos inteiros e cachos de
bananas. Ao lado do tabuleiro um homem, mais menino do que homem, mas um homem.
Eles chegaram em seis, o mais gordo dizendo não
pode, não pode, não pode. O homem quase menino pôs as mãos na cabeça, é
assim que eles pedem. O policial mais gordo abriu os sacos plásticos que o
homem quase menino oferecia para os fregueses e começou a enchê-los com as
fatias de melancia, com os pêssegos, com as bananas. Os transeuntes passavam
devagar. Não pode!, o homem quase menino devia saber. Nunca ouviu falar em
CNPJ, cadastros, alvarás, licenças, impostos, taxas, fiscais? Ô, menino quase
homem, para vender por aqui tem que pegar fila e ganhar carimbos. E eu... Vi as
frutas nos sacos plásticos, o homem quase menino entrando no carro, as viaturas
saindo e não gritei. Não gritei quero
comprar todas as frutas. Não gritei deixem
o homem quase menino vender as frutas, elas estão tão bonitas! Não gritei.
Não criei caso. Não criei caso porque já tinha criado caso com o bancário.
Porque já tinha criado caso com os dois guardas que cuidam das portas
giratórias que não deixam ninguém entrar tranquilo num banco. Porque já tinha
criado caso com o cartorário. Porque já tinha criado caso com o chefe do
cartório. Porque já tinha criado caso com o juiz. Porque sempre crio caso com
quem se identifica com uniforme e crachá. Porque sempre me perco em número de
vias e códigos e taxas e palavras como colenda, egrégio, excelentíssimo e
vênia. Porque se persigo a justiça deveria ter gritado na rua em vez de
preencher corretamente um formulário e uma petição. Porque devo estar muito
cansada. Essa noite sonharei com os pêssegos, vermelhos; com as fatias de
melancia, orvalhadas; com os cachos de bananas, verdes e amarelas; com as mãos
do homem quase menino na cabeça, ...;
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