Ele me deixava comer quantos doces eu conseguisse antes do
almoço e do jantar. Me ensinou a jogar açúcar no iogurte natural, a ponto do
pastoso virar sólido. Eu tinha uns seis anos e ele me deu uma caixa com um
quilo de bombons recheados com licor de cereja. Comi todos sozinha, talvez mais
alegremente do que deveria uma criança nessa idade. E eu olhava para ele,
careca e barrigudo, e pensava: que graça teria a vida sem ele? E fantasiava que
quando ele morresse eu entraria no caixão sem que ninguém me visse, me esconderia
por baixo do corpo dele e lá iríamos nós para o inferno continuar a diversão, porque eu sei que ele detestava a ideia de um céu com anjos e um deus o esperando de braços abertos. E
quando ele morreu, eu com quatorze anos, ele com a idade que meu pai, filho
dele, completará amanhã, eu não fui ao velório, nem ao enterro e só chorei
muitos anos depois. Mas vira e mexe ele invade o meu pensamento, cheio de
açúcar, e eu escrevo a mesma história. Assim como aconteceu hoje, logo que
acordei.
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