Como me parir aos quarenta anos, com o cordão enrolado no
pescoço, os pulmões cheios de mecônio, sentada em uma posição da qual não
consigo sair sem ajuda, enquanto a eu parturiente tem pressão alta e nem um
mísero milímetro de dilatação? No abraço das afogadas, não identificamos a
parasita e a hospedeira, eu feto preciso da não dilatação, eu parturiente da
posição sentada, e seguimos unidas, fingindo uma alegria em um resto de
conforto que não conseguimos mais fingir que existe. Posso sair homem, posso
sair mulher, posso sair pobre ou rica, gorda ou magra, advogada ou médica,
solteira ou casada, loira ou morena, burra ou inteligente, mas é tão grande o
medo, com a morte pelo menos não há decisões a serem tomadas, se existisse um
Deus que me tirasse o livre-arbítrio para ele eu rezava, livrai-me, Senhor, do
livre-arbítrio e decida o melhor por mim, algo que me permita ao menos respirar
sem esse cordão em volta do pescoço. Que eu possa me parir e chorar, agora do
zero, tudo de novo.
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