domingo, 21 de fevereiro de 2016

Minhocão


É domingo. Vejo tudo mais próximo, desprotegida da lataria e dos vidros do carro, sem ar condicionado, sem notícias apocalípticas cuspidas pelos jornalistas, a passos rápidos que vão se tornando cada vez mais lentos para que eu não perca nenhum detalhe da senhora gorda e grisalha que se espreme na varanda repleta de plantas enquanto fuma um cigarro, dos parentes a rir em volta da mesa da sala de paredes cor de rosa, da mãe que passava roupa com a ajuda de cinco filhos, quer dizer, de três, porque um mal andava com a chupeta entre a boca e o nariz e uma seguia o irmãozinho que mal andava com a chupeta entre a boca e o nariz, do homem que bebia cerveja sentado na janela do seu quarto na pensão, enquanto olhava o colega jogando roupas numa mala, da mulher que resolveu esvaziar o guarda-roupa e espalhar todas as suas vestimentas pela cama e pelo chão, da criança que assistia a um desenho na tevê, do velho barrigudo que limpava parafusos, do casal que arrumava a cama, de tantos passarinhos na gaiola que parei de contá-los enquanto caminhava a passos lentos para não perder nenhum detalhe da vida exageradamente humana numa tarde de domingo.


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