sexta-feira, 3 de maio de 2013

Vidas partidas


João Silvério tomou o último gole e levantou-se, derrubando a cadeira. Cambaleou até a porta do bar e, com o polegar direito erguido, avisou ao dono do estabelecimento que pagaria depois. Na calçada, viu Rosemeire, a Rose, sempre à espera de uma oportunidade. Os filhos dela, um menino com dois anos e uma menina com quatro, estavam sentados aos pés da mãe, que vestia calça jeans surrada, blusa de lã branco encardido e chinelos de dedo.

João emitiu um grunhido e Rose passou a caminhar ao lado dele. As crianças atrás, de pés descalços e mãos dadas. Caminharam até a chácara onde João trabalhava como caseiro. Ele não conseguiu encaixar a chave na fechadura. Rose ajudou. As crianças reclamaram de cansaço. Rose deu uma bofetada na menina e um beliscão no braço do menino.

Entraram e ficaram na sala. Rose e João com as calças abaixadas até os joelhos, ela jogada no sofá, ele por cima. As crianças sentadas no chão, em frente, reclamaram de fome. Rose jogou João para o lado, deu mais uma bofetada na filha e um beliscão no filho. Voltou para o sofá e colocou João por cima dela de novo – não estava tão bêbado. Ele riu quando gozou. Rose jogou-o novamente para o lado, disse que ele fedia como porco, subiu a calça e esticou a mão. Vai, vinte aí, olha essas crianças reclamando de fome. A menina disse que queria ir embora, o menino chorou. E antes de pegar os vinte reais e um maço de cigarros que viu sobre a mesa de centro, Rose deu mais uma bofetada e um beliscão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário