Não fumo. Mas poderia agora arranjar
um cigarro e um isqueiro e me debruçar pela janela sobre a Avenida Paulista
para dar uma longa tragada, sentir meus pulmões se encherem de ainda mais
fumaça até o limite, até onde também levaria a metade do meu corpo pela janela,
só para experimentar, só para borbulhar o sangue, só para repensar, só para
enxergar que não há nada além disso, na-da, por isso eu deveria fazer alguma
coisa, me mudar para Tapiraí ou Ubatuba e deixar de chorar sobre o concreto.
Como seriam as minhas tantas outras vidas possíveis? Um pé de jaca no quintal,
um cachorro cheio de lama, as solas dos pés rachadas das crianças, menos dor de
cabeça, chá de folhas e não de saquinhos, que vida, meudeus, que vida!, meu
cabelo com cheiro de grama, estrelas, o dinheiro debaixo do colchão, o cigarro
está acabando e eu não fumo. Só esse. Mas nada é muito possível durante um só
cigarro.
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