quinta-feira, 10 de julho de 2014

Des-per-ta-dor

Alguns nomes não combinam com a coisa que representam, como despertador. O derivado do verbo despertar deixa de fora a agressão a que somos submetidos ao acordar com esse aparelho, ainda que seja programado para tocar nossa música favorita. Onde estão as mãos da minha mãe acariciando os meus cabelos e cochichando no meu ouvido ainda sonolento que é hora de acordar e que o café já está pronto sobre a mesa posta? Onde está minha mãe que me ajudava a trocar de roupa debaixo do cobertor nas manhãs de inverno? Agora é esse ruído saído de um aparelho mais frio que a manhã, cuja desconfiança me faz acordar durante a madrugada para checar se ainda não chegou a hora mesmo de eu ser despertada. Às vezes programo a voz do Chico Buarque, mas então ela me acalenta em vez de me tirar rapidamente da cama, e fecho os olhos, e imagino, e sorrio, e me enrosco no travesseiro, e rolo para a direita, e rolo para a esquerda, e começo a sonhar de novo, e levanto atrasada. E o dia se enche de suspiros, na vã tentativa de dar conta de tantas tarefas. E tantas saudades. 

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