Todas as
histórias já foram escritas. E vividas. Assim, o que faz ela com uma caneta na
mão a olhar para a página limpa de um caderno? Ela não é a primeira mulher a
chegar aos cinquenta anos e se perguntar afinal,
o quê? Não é a única dona-de-casa-frustrada-por-não-ser-médica-ou-advogada-ou-dentista-ou-enfermeira-ou-professora-ou-qualquer-outra-profissão.
Há médicas frustradas também. E advogadas, dentistas, enfermeiras, professoras,
enfim, mulheres. Mulheres que perderam seus amores para outras mulheres. Meninas que não cresceram. Mães
que enterraram seus filhos. O jornal mostra que há guerras por aí, nesse mundo
que ela não conhece, mas que seja assim, se for para conhecer a dor suprema. Um
homem dorme, caga, mija e come na calçada em frente ao ponto de ônibus onde ela
espera o filho voltar do trabalho todas as noites, a duas quadras de casa. Ele
é um homem, mas ela é mãe. Não há nada que já não tenha sido vivido. E toda
vida humana dá um livro. To-da. Ela não tem alternativa, a não ser fechar o
caderno, deixar cair a caneta e fazer um café fresco para o marido que chegará
às seis em ponto.
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