Sexta-feira,
nove da noite. Era a quinta vez, naquela semana, que ela, aos oitenta anos,
colocava os netos na cama e saía de casa. Da casa dela. Da casa para onde a
filha voltou com seus próprios filhos, depois de perder o marido para a mulher
da mesa ao lado, mais magra e menos estressada, e o emprego para a crise, essa mais
gorda. E como era dessas mães incapazes de dizer não, ao menos nesses momentos
em que a filha chegava a ela em pedaços, disse sim, sejam bem-vindos. E abraçou
a filha, segurando o choro, e beijou cada uma das três crianças na testa,
rezando em silêncio para que ficassem bem. A escravidão imposta pela
maternidade, afinal, não tinha fim. Talvez só um descanso. E gastou mais no
supermercado, e cozinhou, limpou e lavou para cinco, sempre rezando, sempre em
silêncio, abrindo a boca apenas para sorrir. Deixava a filha vendo a novela
enquanto contava a mesma história para os netos, a única que ela sabia, na
esperança de que as crianças fossem obedientes e conseguissem, um dia,
distinguir o bem do mal. Ela não soube. Sua filha também não. Mas calava. E
depois da história beijava cada um na testa, os olhinhos arregalados
perguntando se tudo ficaria bem. Mas ela saía antes de dar a resposta que não
queria, beijava a filha na bochecha e seguia até a padaria mais próxima.
Um café, um misto quente e um pouco de
esquecimento, por favor.
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