domingo, 1 de maio de 2016

Se alguém por mim perguntar


Não tenho lugar. Na sala, uma tevê ligada em ruídos. No quarto, uma meia-pessoa já dorme. Na cozinha, uma pia de louça suja que ninguém lava. No banheiro, ele vomita. Na varanda, de onde penso em me atirar para uma cidade que não conheço. Terminar a noite num quarto de hotel com um homem cujo nome vou esquecer na manhã seguinte. Não me importo, eu mesma vou dizer muito prazer, me chamo Laura. Falarei bom dia numa língua desconhecida, no primeiro café que avistar pela rua. Pode fazer frio. Pode fazer calor. A cidade pode ser rica. Pode ser pobre. Feia ou bonita. Só precisa ter ruas nunca pisadas por mim. O filme ficou pela metade, o livro ficou pela metade, o almoço ficou pela metade, o xixi ficou pela metade, o sono ficou pela metade, o banho ficou pela metade porque tudo que faço fica pela metade. Há sempre uma febre, há sempre uma fome, há sempre uma dor, há sempre uma sujeira, há sempre uma bagunça, há sempre uma urgência alheia que não me deixa chegar ao fim de mim. Não suporto shopping centers, não suporto resorts all inclusive, não suporto parkings e sales, preciso ir para onde haja ainda alguma verdade. Ou autenticidade já bastaria?



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