domingo, 18 de dezembro de 2016

Procura-se uma parteira


Como me parir aos quarenta anos, com o cordão enrolado no pescoço, os pulmões cheios de mecônio, sentada em uma posição da qual não consigo sair sem ajuda, enquanto a eu parturiente tem pressão alta e nem um mísero milímetro de dilatação? No abraço das afogadas, não identificamos a parasita e a hospedeira, eu feto preciso da não dilatação, eu parturiente da posição sentada, e seguimos unidas, fingindo uma alegria em um resto de conforto que não conseguimos mais fingir que existe. Posso sair homem, posso sair mulher, posso sair pobre ou rica, gorda ou magra, advogada ou médica, solteira ou casada, loira ou morena, burra ou inteligente, mas é tão grande o medo, com a morte pelo menos não há decisões a serem tomadas, se existisse um Deus que me tirasse o livre-arbítrio para ele eu rezava, livrai-me, Senhor, do livre-arbítrio e decida o melhor por mim, algo que me permita ao menos respirar sem esse cordão em volta do pescoço. Que eu possa me parir e chorar, agora do zero, tudo de novo.



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