quinta-feira, 30 de julho de 2015

Maria Fumaça

Na sala da nossa casa tinha uma mesa de centro redonda. Meu pai tinha uma vitrola e minha mãe um rabinho de cavalo. Rabinho porque o cabelo dela, desde que eu a conheci, era fino e não muito comprido, de forma que sempre que ela o prendia num rabo de cavalo ficava um rabinho e não um rabo ou um rabão. Nosso pai viajava muito e ficávamos só com nossa mãe, quando ela não trazia o pai dela para nos fazer companhia (hoje, entendo, quando ela não trazia o pai dela para cuidar dela para ela poder cuidar da gente). Então gostávamos de colocar um disco para tocar na vitrola, do Kleiton e Kledir, para ouvir Maria Fumaça. A música começava devagar (Essa Maria Fumaça é devagar quase parada) e nós três – eu, meu irmão três anos mais novo que eu, minha irmã dois anos mais nova que meu irmão – começávamos a correr em volta da mesa de centro redonda. O ritmo da música começava a acelerar (oh seu foguista bota fogo na fogueira) e nós acelerávamos junto, e nossa mãe entrava na corrida, atrás dos três filhos, os três filhos atrás da mãe, nós quatro uma maria fumaça completa, as oito pernas cada vez mais aceleradas (e dá-lhe apito e manivela passa sebo nas canelas), as risadas cada vez mais altas, não podíamos perder tempo, tínhamos que dar o nosso máximo (se por acaso eu não casar alguém vai ter que indenizar), e de tudo o que havia ali, naquela casa, naquela sala, naquele momento, em volta daquela mesa, o que eu mais gostava de ver era o rabinho de cavalo da minha mãe voando enquanto ela ria e corria em volta da mesa como um de nós três.


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