quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Consolação


Acordou com as badaladas que marcavam a metade de um dia como se anunciassem uma festa. A cabeça doía, não conseguia fixar os olhos no relógio que marcava as horas que ele já sabia quais eram: talvez a grande batalha humana seja livrar-se de um hábito. A garrafa vazia no chão de carpete verde e puído, pontas de cigarro que formavam um pequeno Everest sobre o cinzeiro, a sola do pé encardida de tanto carpete, o lençol florido atirado para fora da cama, a presença da ausência dele, a foto dos dois sorrindo no porta-retratos. A tentação de rasgá-la impedida pelo sentimento de que assim o mataria. Foi até a janela, no caminho procurou por um cigarro, encontrou uma maçã, um pouco murcha, mas uma maçã. A Igreja da Consolação já em silêncio, mais uma vez vislumbrou seu corpo caindo do oitavo andar, nem dia de confissão era. Teria que aguardar as nove horas da manhã seguinte. Vestiu uma camiseta jogada sobre o sofá estampada com a advertência your ego is not your amigo e saiu para comprar cigarros e uma caixinha de água de coco.

Nenhum comentário:

Postar um comentário