A cena final de Melancholia,
de Lars Von Trier, eu já tinha visto antes do filme chegar aos cinemas.
Provavelmente antes do filme ser editado. Foi quando meu primeiro filho nasceu.
Eu anestesiada debaixo do foco de luz do centro cirúrgico, o choro daquela
criança misturado ao meu, a sensação de que meu corpo rebentaria de tanta
emoção indizível, e a voz de um pediatra dizendo que aquele bebê iria para a
UTI e passaria por uma cirurgia inesperada no dia seguinte. Foi quando eu vi
Melancholia se aproximar, saído do foco de luz. Sem tempo para eu me esconder
numa cabana mágica. Sem tempo para mãos dadas. Uma enfermeira manipulava pernas
ligadas ao meu tronco, mas que não me pertenciam. De quem eram aquelas pernas moles? O silêncio. As pessoas e os
objetos congelados. A saída do anestesista para um café e eu esquecida. Eu e
Melancholia no silêncio branco de um centro cirúrgico. Meu grito anestesiado na
garganta. Melancholia se aproximando povoado de sapos, o bicho que mais apavora
minha existência. Então parir é isso: ter o coração rebentado de amor, ser
perseguida por um planeta desgovernado, ter de enfrentar os meus maiores medos
e soltar...porque tudo isso pertence só a mim.
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